A LIPEMIA PÓS-PRANDIAL COMO FATOR DE RISCO PARA DOENÇA ARTERIAL CORONARIANA
O termo lipemia pós-prandial se refere a uma série de eventos metabólicos relacionados ao aumento na concentração de lipoproteínas (LP) ricas em triglicérides (TG) - quilomícrons (Qm) e seus remanescentes, lipoproteína de muito baixa densidade (VLDL) e seus remanescentes - ocorrida após a ingestão de gorduras6.
A lipemia pós-prandial tem sido sugerida como fator de risco para DAC4,12. No estado pós-prandial, um maior tempo de permanência da elevação de lipoproteínas ricas em triglicerídeos pode causar disfunção endotelial2, menor disponibilidade de óxido nítrico e aumento de estresse oxidativo12 e alterações envolvidas na gênese da aterosclerose.
Evidências relacionadas ao conceito de que o processo aterosclerótico é um fenômeno pós-prandial foram evidenciadas por Zilversmit (1979)16, ao demonstrar em animais e em humanos que remanescentes de quilomícrons e lipoproteínas de baixa densidade (LDL) são captados por células endoteliais.
Entre os mecanismos responsáveis pela maior ategerogênese decorrente da lipemia pós-prandial encontram-se o aumento das lipoproteínas ricas em triglicerídeos (LpRT), a hiperglicemia e hiperinsulinemia, o estresse oxidativo, o processo inflamatório e a disfunção endotelial14.
Lima et al (2002) correlacionaram a hipertrigliceridemia pós-prandial com conhecidos fatores de risco para aterosclerose em 47 pacientes não diabéticos, com trigliceridemia de jejum normal (<200mg/dl). Concluíram que a hipertrigliceridemia pós-prandial se correlaciona com vários fatores de risco cardiovascular, mesmo em pacientes normotrigliceridêmicos9.
Issa et al (2005) investigaram o comportamento da lipemia pós-prandial, avaliada por meio de medidas repetidas de triglicérides, em indivíduos saudáveis de 20 a 50 anos de idade. Verificaram que, em amostra populacional adulta saudável, o envelhecimento exerce influência sobre o comportamento da lipemia pós-prandial6.
Vale ressaltar que a ingestão de uma refeição rica em gorduras causa aumento de triglicerídeos plasmáticos, enquanto que as concentrações de colesterol não se modificam significativamente3. A curva lipêmica pós-prandial é avaliada pela magnitude (duração e/ou extensão), que corresponde ao tempo para o retorno aos valores basais dos triglicerídeos e pela amplitude (e/ou pico), que corresponde ao momento em que ocorre o valor máximo encontrado após sobrecarga lipídica14.
Karpe et al (1992) estudaram o efeito de uma sobrecarga lipídica oral sobre os níveis de triglicerídeos, ácidos graxos livres (AGL) e atividade da lipase lipoprotéica (LPL) por 12 horas, em 10 indivíduos saudáveis e em 34 pacientes pós-infarto do miocárdio; e verificaram que os triglicerídeos se elevaram conforme esperado 8.
Uma das dificuldades para se estabelecer e utilizar as medições da lipemia pós-prandial na prática clínica diária é a inexistência de um protocolo padrão e de fácil aplicação. Não há consenso em relação ao tipo de alimento ingerido, à quantidade de gordura ingerida, aos tempos de coleta após a sobrecarga nem aos valores normais9.
Grande parte dos estudos publicados sobre lipemia pós-prandial avalia, geralmente, picos de apoproteínas e de lipoproteínas ricas em triglicerídeos5,10,11, que são de difícil medição na prática clínica. Além disso, tais estudos utilizam, muitas vezes, refeições-teste de difícil preparo8,10 e protocolos muito longos, necessitando de assistência de nutricionistas ou de internamento hospitalar do indivíduo estudado9.
Em resumo, a lipemia pós-prandial é um evento que tem sido associado com obesidade visceral, hipertrigliceridemia de jejum, diabetes mellitus tipo 2 e doença coronariana. Assim, maior atenção deve ser dada a estas alterações, principalmente no estabelecimento de critérios diagnósticos e indicações terapêuticas.
Referências:
1. American Heart Association. Heart and stroke statistical update. Dallas: American Heart Association, 2001.
2. Anderson RA, Evans ML, Ellis GR, Graham J, Morris K, Jackson SK, et al. The relationships between post-prandial lipaemia, endothelial function and oxidative stress in healthy individuals and patients with type 2 diabetes. Atherosclerosis 2001;154:475-83.
3. Axelsen M, Smith U, Eriksson JW, Taskinen MR, Jansson PA. Postprandial hypertriglyceridemia and insulin resistance in normoglycemic first-degree relatives of patients with type 2 diabetes. Ann Intern Med 1999;131:27-31.
4. Burdge GC, Calder PC. Horizons in nutritional science plasma cytokine response during the postprandial period: a potential causal process in vascular disease? Br J Nutr 2005;93:3-9.
5. Couillard C, Bergeron N, Prud'homme D, Bergeron J, Tremblay A, Bouchard C, et al. Postprandial triglycride response in visceral obesity in men. Diabetes 1998;47:953-60.
6. Issa JS, Diament J, Forti N. Lipemia pós-prandial: influência do envelhecimento. Arq. Bras. Cardiol. 2005, 85(1).
7. Karpe F, Olivecrona T, Walldius G, Hamsten A. Lipoprotein lipase in plasma after an oral fat load: relation to free fatty acids. J Lipid Res 1992;33:975-84.
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