RIO - Enquanto não inventam o elixir da juventude ou uma pílula antienvelhecimento, não tem jeito. É para lá, para a velhice, que todos nós vamos, na melhor das hipóteses. Com o aumento da expectativa de vida da população, há e haverá cada vez mais gente na terceira idade. O desafio que se coloca para quem já passou dos 60 anos - e para quem está a caminho - é o da qualidade de vida. Como manter o bem-estar, a autonomia e o otimismo numa fase em que a máquina já não apresenta o mesmo rendimento de outros tempos? Não é fácil, mas muito possível.(Alguns cuidados com a mente e com o corpo ajudam) Profissionais de saúde, professores e gente que mantém o prazer de viver na fase mais madura da vida dão as dicas.
Lançado recentemente, o livro "A Arte de Envelhecer" (editora Objetiva, 256 páginas, R$ 34,90), do médico americano Sherwin B. Nuland, cirurgião de 70 anos, discute o tema com franqueza. Ao mesmo tempo em que aponta e reconhece as limitações que o tempo traz ("por volta dos 65 ou 70 anos, cerca de um terço da força muscular se perdeu, e a perda se torna mais rápida à medida que os anos avançam", diz o autor), Nuland sugere caminhos. E o faz não só na condição de médico, mas, inclusive, na de homem da terceira idade que experimenta os desafios de uma nova fase. "A capacidade de se adaptar, aprender e aceitar as próprias limitações é um determinante do que a bibliografia da geriatria chama de envelhecimento bem sucedido", destaca. "Não existe fonte da juventude, mas temos mananciais nutritivos de um tipo diferente, muito melhor e realista. O envelhecimento é uma continuidade de tudo o que nos tornamos em uma fase anterior", ensina.
Faço alongamento, hidroginástica. A gente tem é que se cuidar, envelhecer não é problema.
- Envelhecer, para quem tem a cabeça fraca, é doença. Para mim, é saúde. O segredo está na cabeça - sentencia Maria Augusta de Souza (foto abaixo), 76 anos, ou, simplesmente, Hip-Hop, como é conhecida na academia de ginástica que freqüenta assiduamente no centro do Rio.
O apelido é uma homenagem ao estilo inquieto e divertido desta aposentada sem filhos que ficou viúva há cinco anos e resolveu reagir para não se deixar levar pela tristeza.
- Deus levou meu marido, fiquei um pouco zangada com Ele, mas já fiz as pazes. Então eu passei a freqüentar academia. Adoro esse convívio, isso aqui é a minha família - conta.
Ginástica, musculação, exercícios. Tudo que faz tão bem a Augusta ajuda também a manter o bom astral e a vitalidade de Maria Iolanda Barbosa (foto abaixo), 70 anos. "O exercício vigoroso planejado é um tratamento antienvelhecimento muito melhor do que todos os elixires, cremes, loções, poções e cirurgias cosméticas do mundo", diz o doutor Nuland. E não serve só ao corpo. Faz bem ao raciocínio, conforme ensina o médico escritor: "Estudos recentes verificaram que a aptidão aeróbica em homens e mulheres mais velhos parece reduzir a perda de tecido do cérebro e melhorar o funcionamento cerebral".
- Eu faço alongamento, eu faço hidroginástica, caminho todos os dias, vou muito ao Maracanã ver o meu Flamengo jogar, tenho neto, bisneto, me sinto ótima - relata Iolanda, feliz da vida com marido, três filhos, sete netos e três bisnetos. - A gente tem é que se cuidar. Eu faço exame preventivo, vou aos médicos. Envelhecer não é problema.
Não pode ocorrer tristeza e solidão, o idoso tem que ter projetos de vida
Netos, bisnetos, família, amigos. Gente. O contato com pessoas e uma vida emocional ativa ajudam muito a envelhecer com arte. O geriatra Leo Cooney, da Universidade de Yale, um dos maiores especialistas dos Estados Unidos, chama a atenção: "Se existe um ideal supremo, são as relações com outras pessoas. Se for preciso decidir entre ir à ginástica ou ficar com os netos, escolheria os netos". No capítulo em que cita Cooney, o doutor Nuland lembra uma estatística trágica, que reflete os efeitos da solidão. "Supõe-se que 20% dos idosos fiquem deprimidos em dado momento e o número real deve ser maior, porque muitos não procuram tratamento", informa.
- A perspectiva da proximidade da morte é verdadeira quando a pessoa está idosa. E o que não pode ocorrer é tristeza e solidão. O idoso tem que ter projetos de vida, independente da idade. Não quer dizer necessariamente projeto profissional, mas pequenas atividades, hobby, esporte. Pode ser mesmo o simples objetivo de se cuidar para poder sair de casa, fazer sua compra, ir à igreja, visitar o filho - opina o geriatra Renato Veras, 56 anos, diretor da Universidade Aberta da Terceira Idade (Unati), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).
Toda idade pode ser melhor idade
A funcionária pública aposentada Alice Reis Abreu, à beira de completar 93 anos, sabe bem a importância de sentir-se útil. A idade avançada não a impede de ainda cuidar de dois dos três bisnetos, com 7 e 5 anos de idade (o mais novo está perto de completar um ano). Freqüentemente ela os recebe quando chegam do colégio e lhes serve o jantar.
- Vivendo bastante, eu posso ajudar nora, netos e bisnetos. Conservar amizades também é muito importante. Tenho até hoje amigas do tempo de colégio - diz, acrescentando à receita de longevidade um ingrediente: - Nunca fui de engolir sapo. A hora em que não gosto de alguma coisa, esculhambo mesmo. O que eu tenho que dizer, eu digo.
Com uma vida ativa, o idoso consegue se aproximar da noção de "melhor idade", cunhada nos meios de comunicação quando se iniciaram as campanhas de valorização da terceira idade.
- Toda idade pode ser melhor idade, sabendo viver bem. Melhor idade é a melhor fase, é saber como você lida com cada uma delas. O importante é que para o idoso também é possível ter qualidade de vida - garante a psicoterapeuta Amanda Spinicci.