Ele tirou a roupa no meio da rua e urinou nas janelas dos carros. Um escândalo para os passantes da pequena cidade de Três Corações, em Minas Gerais. Mas apenas uma história para o estudante de engenharia Douglas*, 24, contar. Pouco tempo antes, o jantar dele foi uma mistura não balanceada de álcool, maconha e lança-perfume. “Foi a virada de ano mais louca da minha vida”, assume Douglas, mesmo tendo quebrado o pé naquela noite. “Na hora, eu nem senti dor, e a viagem ganha um visual diferente quando a gente fuma.” Já o administrador Sidney*, 25 anos, manteve uma rígida dieta à base de álcool e cocaína durante os quatro dias de Carnaval que passou em Ubatuba, no litoral paulista. “Não costumo usar essas coisas, mas era uma ocasião especial”, garante.
Os dois jovens fazem parte dos 5% da população adulta mundial que ingeriram alguma substância ilícita em 2010, segundo o Relatório Mundial Sobre Drogas 2012 da Organização das Nações Unidas (ONU). São 230 milhões de pessoas correndo risco de efeitos colaterais como taquicardia, câncer de pulmão e até morte. Ainda assim, quem nunca ficou tentado a enfiar o pé na jaca no fim de ano ou no Carnaval que atire a primeira lata de cerveja.
Estudo do Serviço de Administração de Abuso de Substância e Saúde Mental (EUA) mostra que os jovens são mais propensos a fumar, beber e experimentar drogas no verão, quando estão longe de supervisão. Para o psiquiatra Carlos Salgado, da Associação Brasileira de Estudos de Álcool e outras Drogas (Abead), as festas e as férias facilitam o uso de substâncias ilegais: “Há uma liberalidade com o álcool, porta de entrada para as outras drogas”.Bêbado, você não presta muita atenção aos riscos.
Mas não pense que isso só acontece em lugares marginalizados. Muito pelo contrário. Pesquisa realizada pela Secretaria Nacional de Política sobre Drogas revelou que quase metade dos universitários, 49%, experimentou algum tipo de droga ilícita. Além disso, 80% dos jovens menores de 18 anos de todas as classes sociais já beberam álcool. É nessa faixa etária que o consumo de drogas costuma começar. “As áreas do cérebro responsáveis pelo controle de impulsos e compreensão de regras desenvolvem-se completamente apenas depois dos 20 anos”, explica Heloísa Garcia Claro, especialista do Grupo de Estudos em Álcool e outras Drogas da Universidade de São Paulo (USP).
Segundo a ONU, a maconha é a droga ilícita mais consumida no mundo. Estimativas apontam que o número de usuários fique entre 119 e 224 milhões de pessoas. As anfetaminas seguem no segundo lugar. Mas o mercado de ecstasy está em expansão: em 2010, a ONU registrou a apreensão de 1,3 tonelada dessa “bala” – mais que o dobro em relação ao ano anterior. O número de usuários de cocaína variou entre 13,3 e 19,7 milhões no mundo. E o Brasil é o segundo maior consumidor mundial de coca e crack, atrás apenas dos Estados Unidos. Essas drogas são consumidas por 2,6 milhões de adultos no país, segundo o Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (Lenad), da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Como Douglas e Sidney, é muita gente arriscando demais a própria saúde, a longevidade, em prol de momentos curtos de diversão. Conheça mais detalhes dessa relação – barato versus roubada…
MACONHA
O barato – Ela geralmente deixa o corpo relaxado e a paz parece dominar o pensamento. O impacto em uma roda de amigos pode ser de alegria geral. Talvez por isso… Segundo levantamento da Unifesp, 1,5 milhão de brasileiros fumam todos os dias. É como se, diariamente, a população inteira de Porto Alegre desacelerasse o cérebro com a maconha.
A roubada – Cientistas da Universidade de Duke (EUA) afirmam que o uso frequente da maconha antes dos 18 anos causa danos irreversíveis à inteligência, à atenção e à memória. E, segundo a Fundação Britânica do Pulmão (Inglaterra), quem fuma um baseado (cigarro de maconha) todos os dias tem a mesma chance de adquirir câncer de pulmão do que quem fuma um maço de cigarros diariamente. Isso por causa das inalações profundas e do tempo que a fumaça fica no organismo. Logo, quem usa maconha traga quatro vezes mais alcatrão e cinco vezes mais monóxido de carbono do que quem fuma tabaco. Além disso, tuberculose, bronquite aguda e diminuição no nível de testosterona também estão relacionados ao uso da erva.
ECSTASY
O barato – As luzes ficam mais vibrantes, a música também. Tudo fica mais bonito e sensual quando tem ecstasy na parada.
A roubada – Produzida em laboratório e conhecida como a droga do amor, o ecstasy eleva a temperatura corporal e, em certos casos, o apetite sexual, mas, como vontade e desempenho são diferentes, ele também pode aumentar em 50% sua chance de broxar e diminuir a lubrificação natural da sua garota. “A longo prazo, o uso pode causar disfunções hepáticas e renais, convulsões, hemorragia cerebral e morte súbita”, alerta Heloísa. Mas se mesmo assim você ficar tentado a saber como é viajar sem sair do lugar, fique esperto: um levantamento da Superintendência da Polícia Técnico-Científica de São Paulo revelou que apenas 44,7% das drogas sintéticas apreendidas no estado em 2011 continham o princípio ativo do ecstasy, o MDMA. Ou seja, muita gente anda comprando remédio para emagrecer e anestésico de cavalo achando que é ecstasy.
COCAÍNA
O barato – Ela dá sensação de energia, confiança, sociabilidade e poder.
A roubada – Tudo isso vai embora tão rápido quanto chega. Pesquisa publicada no British Medical Journal revelou que o abuso da coca pode provocar danos no coração sem mostrar sintomas. Autópsias indicaram que o coração de um em cada quatro usuários mortos tinha inflamação do miocárdio, que provoca infarto. Além disso, quem abusa dos tiros (ação de cheirar a droga) pode acelerar o processo de envelhecimento do cérebro, como afirma pesquisa da Universidade de Cambridge (Inglaterra).
CRACK
O barato – Ele precisa de apenas 15 segundos para criar uma sensação de euforia intensa no cérebro. Além de espantar o sono e causar perda de peso intensa no começo do uso.
A roubada – Os efeitos são devastadores: um em cada três usuários morre por culpa do crack após meses de uso. Essa droga pode causar desnutrição, infartos e derrames. Ela se alastra rápido por todos os lados. O último levantamento da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo constatou que o crescimento do consumo de crack entre pessoas de renda superior a 20 salários mínimos foi de 139,5%
ANFETAMINA
No verão, o número de caras que querem recuperar o tempo perdido aumenta nas academias. Mas, nem sempre, treinar é a opção para enxugar o shape. Muitos preferem alternativas mais rápidas para emagrecer, como tomar anfetaminas. Segundo a ONU, essa é a segunda droga mais consumida no planeta. “Ela aumenta a liberação e prolonga os efeitos da noradrenalina e da dopamina, substâncias responsáveis pelo prazer, humor, sono e outras coisas boas”, explica a especialista Heloísa Garcia Claro. Mas fique ligado: além de um shape de ator de filme de ação, o uso dessa droga pode provocar taquicardia, aumento da pressão arterial, alucinações e convulsões – e pode deixar você mais parecido com um pitboy agressivo e irritado.
ANSIOLÍTICO
A pressão para cumprir prazos e a ansiedade que batem no fim do ano fazem muita gente recorrer a calmantes sem prescrição médica. Não à toa, um medicamento desse tipo é o segundo remédio mais vendido no Brasil, segundo o instituto IMS Health (EUA). O ansiolítico é recomendado para transtornos de ansiedade, bipolaridade e depressão. Como pode camuflar problemas emocionais, garantir uma boa noite de sono e até limar o efeito de outras drogas que aceleram o organismo (como a cocaína), os usuários parecem não se importar com o fato de ele ser tarja-preta e causar dependência química e psicológica. Os efeitos colaterais podem incluir apatia, delírios e até internações por abstinência.
Prazer além das drogas
O “tesão” oferecido ao cérebro por elas pode ser substituido por outros estímulos
A maior parte das drogas libera no organismo substâncias químicas ligadas ao humor e ao prazer, como a serotonina e a dopamina. “Nosso cérebro funciona como um sistema de recompensas”, explica Heloísa Garcia Claro. Segundo a especialista, algumas atividades dão prazer e o cérebro pede para repeti-las: são os chamados reforçadores. O prazer obtido com o uso de substâncias ilícitas é um reforçador, por isso queremos fazer de novo. Mas nós também podemos atingir o efeito dos reforçadores sem o atalho das drogas. Um artigo publicado no Journal of Psychiatry & Neuroscience (EUA) afirma que atitudes simples, como treinos na academia e até sair de casa e pensar positivo, podem aumentar o nível de serotonina no cérebro. “Quem tem outras fontes de prazer e realização, incluindo vida profissional, sexualidade saudável, esportes, hobbies e esforços de educação continuada tende a lançar menos mão do uso de drogas”, afirma o psiquiatra Carlos Salgado.
Moda de fora
Estas drogas já têm consumidores cativos em outros países e estão desembarcando por aqui. Fique de olho e evite roubada
MEFEDRONA
Miau-miau, M-Cat, MC… Os apelidos da mefedrona são inofensivos. Os efeitos, não. Enquanto garante uma noite incrível com a parceira, na pista ou na cama, esse pó (ou pílula) também oferece problemas. Nos EUA, ela é conhecido como “sais de banho” – por causa da embalagem – e foi considerada a causa de um americano de 31 anos ter comido 75% do rosto de um mendigo em Miami, este ano. Sim, comer! Isso porque o efeito da mefedrona pode ser comparado ao da mistura de cocaína, LSD e ecstasy. A droga era, na verdade, um fertilizante para plantas vendido legalmente. Começou a fazer sucesso nas boates europeias, chegando a ser o quarto entorpecente mais usado pelos jovens britânicos, segundo pesquisa da revista de música eletrônica Mix Mag (EUA).
METANFETAMINA
Já não se via metanfetamina no Brasil há um tempo. Mas, no final do ano passado, a Polícia Federal apreendeu 145 mil comprimidos no Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo. Ela é vendida nas baladas como se fosse ecstasy. Mas não é. Ela vicia rapidamente. O custo que se paga por uma euforia de oito horas e potência sexual de até 30 horas é alto: em dinheiro, chega a valer até 200 reais; à vida, faz com que o usuário envelheça precocemente, matando-o em dez anos.