Compreender como os pulmões se desenvolvem e, sobretudo, como envelhecem é fundamental para entender a saúde e a doença.
Para os pulmões exercerem suas funções, é necessário que o ar entre e saia deles com a maior rapidez possível, isto é, que o fluxo de ar seja o maior possível. Essa medida de fluxo pode ser obtida durante o teste de espirometria (prova de função pulmonar) e é conhecida como volume expiratório forçado em um segundo, VEF1, ou seja, quanto ar expelimos em um segundo numa expiração forçada. Com o envelhecimento, esse fluxo tende a cair.
Para responder como os pulmões envelhecem, Kohansal e colaboradores utilizaram dados obtidos na cidade de Framingham, nos EUA, onde pessoas saudáveis foram seguidas por 23 anos, realizando testes de espirometria a cada quatro anos. A pesquisa envolveu 4.391 pessoas de ambos os sexos, com idades que variaram de 13 a 71 anos. É o maior estudo dessa natureza já realizado e com o maior tempo de seguimento.
Nos homens não fumantes, o máximo valor de VEF1 ocorre por volta dos 23 anos. A partir dessa idade, ele começa a cair, com uma perda média de 20 mls ao ano. Se considerarmos que o valor máximo médio verificado foi de 3.700 mls, em 50 anos um homem não fumante terá perdido cerca de um litro de capacidade ou 27% do valor inicial.
As mulheres não fumantes não apresentam pico nos valores do VEF1; dos 20 aos 40 anos, a função fica estável. A partir daí, a perda é um pouco menor do que a dos homens, 17,5 ml. ao ano. Para quem tem, no inicio, um valor médio de 2700 ml., essa perda representa, em 50 anos, 570 ml., ou 20 % do valor inicial
Entre os participantes, 754 pessoas já eram fumantes no inicio dos trabalhos e persistiram fumando durante todo o estudo. Nessas pessoas, a perda de função foi de 38 ml. ao ano para homens, e 24 ml. ao ano para mulheres. A diferença em relação aos não fumantes dá uma dimensão do impacto do fumo sobre os pulmões. Em 50 anos, os homens terão perdido 50 % de sua capacidade respiratória e as mulheres, 45%.
A Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC, que abrange os diagnósticos de bronquite e enfisema) é diagnosticada quando o volume expiratório forçado do um segundo fica abaixo de 80% do predito, considerando a idade, o sexo e a altura do individuo. Um terço (33%) dos homens fumantes e um quarto (24,2%) das mulheres foram diagnosticados como DPOC durante o estudo, comparados com 7% dos homens não fumantes e 5% das mulheres que nunca fumaram. Portanto, quem fuma corre cinco vezes mais risco de desenvolver DPOC do que quem não fuma.
O estudo vai além. Da população inicial, 1924 eram fumantes no início do estudo, mas pararam de fumar no decorrer da pesquisa. No entanto, as curvas de perda de função só são semelhantes às de não fumantes, se o indivíduo parar antes dos 30 anos. Dessa idade em diante, a curva de declínio será maior se você parar entre os 30 e os 40 anos e, maior ainda, se você parar após os 40 anos.
Muito importante, o estudo mostra que se você parar de fumar, a perda de função pulmonar será sempre menor do que a daqueles indivíduos que persistem fumando (figuras A e B).
Figura A: Declínio de função pulmonar ao longo do tempo para homens. NS, não fumantes; Q<30, fumantes que pararam antes dos 30 anos; Q30-40, fumantes que pararam entre os 30 e os 40 anos; Q40+, fumantes que pararam após os 40 anos e CS, fumantes durante todo o estudo
Figura B: Declínio de função pulmonar ao longo do tempo para mulheres . NS, não fumantes; Q<30, fumantes que pararam antes dos 30 anos; Q30-40, fumantes que pararam entre os 30 e os 40 anos; Q40+, fumantes que pararam após os 40 anos e CS, fumantes durante todo o estudo
Em vista desses resultados, podemos concluir que fumar acelera significativamente o envelhecimento dos pulmões. Mais ainda, é possível dizer que parar de fumar a qualquer tempo reduz essa aceleração. O ideal é que os jovens que fumam parem antes dos 30 anos, porque só assim a perda de função será comparável à de quem nunca fumou.
Nesse sentido, a proibição de fumo em bares e outros ambientes públicos, se de fato vier acompanhada da redução de fumantes, é muito bem-vinda. Todo e qualquer esforço no sentido de evitar que jovens comecem a fumar e no sentido de que quem fuma abandone o cigarro definitivamente, representa a medida de maior impacto econômico e, sobretudo, uma medida fundamental para preservar a saúde entre todas as que existem.
Referência
Kohansal R, Martinez-Camblor P, Agustí A, Buist AS, Mannino DM, Soriano JB.The natural history of chronic airflow obstruction revisited: an analysis of the framingham offspring cohort. Am J Respir Crit Care Med. 2009 Jul 1;180(1):3-10.
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