- Descobertas da neurociência ajudam a revelar alguns dos mistérios do desejo, da paixão e do sexo
RIO - Sensações de prazer, pensamentos obsessivos e desejos insaciáveis. Quem já se apaixonou conhece estes e outros sintomas, mas avanços da ciência e da psicologia ajudam a revelar pela primeira vez o que esta estranha “doença” chamada amor faz com nossos corpos e cérebros, contam o neurocientista Larry Young e o jornalista Brian Alexander, autores do livro “A química entre nós — Amor, sexo e a ciência da atração”.
A ciência já é capaz de explicar os mistérios do amor?
LARRY YOUNG: Creio que não. Mesmo para mim, como neurocientista, o amor ainda é algo lindo e misterioso. Mas a ciência também já está começando a entender como as emoções como o amor são geradas em nossos cérebros por alguns compostos químicos e estruturas cerebrais, mas de forma alguma sabemos o bastante para tirar todo o mistério e beleza do amor.
BRIAN ALEXANDER: Concordo com Larry, mas também acredito que, à medida que a ciência explica cada vez mais como os mecanismos do amor funcionam, podemos começar a pensar no amor de formas diferentes. Às vezes, estar consciente de um processo pode fazer com que você o veja de um jeito diferente. Estando mais conscientes do que acontece quando o amor está envolvido podemos tomar atitudes que preservem o que há de bom no amor. No último capítulo de nosso livro falamos dos modos como a sociedade moderna pode estar afetando os laços entre as pessoas e, sabendo como estes laços funcionam, como nossos cérebros criam estes laços entre pessoas, podemos proteger melhor o amor de alguns destes possíveis danos causados pela sociedade moderna.
E como podemos fazer isso?
YOUNG: Ao aprendermos mais sobre estes processos cerebrais do amor, podemos usá-los em nosso benefício. No livro falamos muito sobre o importante papel que a interação entre a oxitocina e a dopamina (neurotransmissores responsáveis por ativar as sensações de prazer, recompensa e empatia, entre outras) tem na construção do amor. Creio que as pessoas envolvidas em uma relação podem então pensar em maneiras de mudar seus comportamentos de forma a estimular a liberação destas moléculas em seus cérebros. Sabendo que a oxitocina está envolvida em focar sua atenção no seu parceiro ou parceira e a dopamina em transformar isso numa sensação de recompensa, então podemos nos engajar em comportamentos que estimulem a liberação de oxitocina, como, por exemplo, olhar nos olhos um do outro, conversar, se abraçar, beijar, trocar carinhos. E fazer isso em um contexto que estimule a liberação de dopamina, como um encontro em um lugar diferente, férias em um local exótico, tudo combinado com uma intimidade sexual, talvez realmente possamos reacender a paixão em relações que estejam esfriando. Parece óbvio que se deva fazer isso, mas a partir do momento que notamos que existem razões científicas para fazer isso, o esforço talvez seja maior.
As estratégias do amor, então, não são muito diferentes das que já conhecemos quase que instintivamente, como dar atenção, carinho, afeto, jantares românticos, mandar flores?
ALEXANDER: Sim, as estratégias do amor podem ser muito simples. Apenas olhar nos olhos de seu parceiro ou parceira, ter uma conexão física íntima, já funcionam. Não precisamos estar a toda hora partindo para viagens exóticas, embora isso também funcione muito bem. Coisas simples como carinhos e conversas doces são armas poderosas do amor. À medida que entramos na nossa rotina diária, tendemos a esquecer a importância destes gestos simples. E embora saibamos que devemos estar atentos a isso, no nosso livro mostramos as razões pelas quais devemos fazer isso.
YOUNG: Um estudo recente revelou que a pele tem neuroreceptores específicos para transmitir os sinais associados a carinhos, cuidados, os toques suaves da intimidade. Estamos começando a entender as conexões entre a pele, o cérebro e a oxitocina e como tudo isso está envolvido no ato simples de se tocar. Acredito que os casais frequentemente não se abraçam o suficiente, não têm contato físico o bastante. O toque é muito importante. Assim, antes mesmo de pensar em flores, encontros românticos, viagens etc. devemos nos focar nas coisas simples.
Esta semana, aqui no Brasil, estaremos no carnaval, uma festa marcada pela liberação das inibições e fantasias, em que muitas relações, momentâneas ou duradoras, começam, enquanto outras tantas também terminam com ciúmes, traições e brigas. O que a ciência tem a nos dizer sobre nosso comportamento em ocasiões como esta?
ALEXANDER: O que acontece nestes momentos é que as pessoas estão como que fazendo um acordo consigo mesmas que diz que, como este é um momento especial do ano, elas vão colocar um pouco em suspenso seu lado racional e permitir que as partes mais primitivas e voltadas para recompensas imediatas de seus cérebros tomem conta. As pessoas costumam fazer isso quando estão em grandes festas como o carnaval e desta forma podem acabar se relacionando com estranhos.
YOUNG: E temos que lembrar ainda que para os homens é mais fácil ter encontros sexuais sem realmente criar laços fortes com a pessoa com a qual estão, pelo menos neste primeiro momento. Assim, as mulheres devem prestar atenção que, embora também possam pensar que estão apenas fazendo um sexo casual, a ciência mostra que nelas estes laços tendem ser construídos mais depressa. Nestas situações, os homens podem ver uma mulher que não conhecem como um simples objeto, alguém com quem fazer sexo. Já as mulheres são mais inclinadas a ver a pessoa e criar laços com ela. Isso pode ser estressante mais tarde, quando a relação não tiver continuidade. O sexo pode ser poderoso, mesmo que se ache que ele é apenas casual. Não há escolha, o sexo ativa a liberação desses neurotransmissores no cérebro e algumas vezes você pode se encontrar em uma posição que não foi planejada. Pode ser algo fora do seu controle.
E quanto às pessoas em uma relação estável? O que elas podem fazer para evitar as tentações do carnaval?
YOUNG: As mulheres, por exemplo, podem estimular a liberação de oxitocina em seus parceiros antes que saiam para a festa. Há estudos que mostram que homens em uma relação monogâmica que têm altos níveis de oxitocina em seus cérebros mantêm distância de outras mulheres atraentes. E o sexo é o mais potente estimulador da liberação de oxitocina. Agora que sabemos da importância deste neurotransmissor para a manutenção de uma relação, podemos literalmente prescrever mais sexo de um ponto de vista neuroquímico. Sexo cara a cara, com a liberação de oxitocina e dopamina associada e os parceiros se vendo, fortalece muito a conexão do casal. Podemos ver isso como ordens médicas para manter o fogo da paixão aceso.
ALEXANDER: Muitas vezes a relação entra numa rotina e tendemos a fazer menos sexo com nossos parceiros. Há uma diferença entre a monogamia social e a sexual e as pesquisas demonstraram o poder da novidade, que estimula a liberação de dopamina e ativa o desejo por outra pessoa. Tendo consciência de que isso acontece com quase todos os casais se pode fazer algo, e isso inclui um esforço deliberado de fazer sexo mais vezes. Quando um homem está feliz e satisfeito, as chances dele procurar sexo em outro lugar são muito menores. Não podemos garantir que vai funcionar, mas fazer sexo com seu parceiro ou parceira antes de saírem de casa para a festa pode ser uma boa estratégia para evitar problemas.
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